terça-feira, 8 de março de 2011

Oração: lugar de aconchego


Como comunidade cristã somos chamados, não apenas ao serviço, mas sobretudo a adoração, isso implica em uma agenda diária em que haja espaço de desenvolvimento intímo com Aquele que estabeleceu um padrão de interioridade centrado na sua relação com o Pai


Ainda pequeno participava com a minha mãe nas reuniões de oração da sociedade de senhoras. Ouvia algumas frases: “... Senhor salva o meu esposo...”, “...oh Deus perdoa-me...”, “... muda minha vida Senhor...”, e assim era a vivência da oração comunitária naquela comunidade.

A oração tem sido uma das áreas que mais tem sofrido abuso e indiferença na espiritualidade atual, por um lado há comunidades que oram, mas o sentido da oração tem sido mais na perspectiva de obter benefícios, na maioria materiais, do que propriamente de um reconhecimento das fragilidades, da necessidade de santificação e de um relacionamento mais íntimo com o Pai Celeste.

Em outro extremo existem aqueles para quem a oração é uma retórica: discutida, analisada e relativizada. No inconsciente coletivo desse grupo orar é um exercício enfadonho, medíocre relegado às pessoas simplórias sem uma intelectualidade aguçada.

Uma parte do universo acadêmico teológico afirma na sua grande maioria, os pressupostos bíblicos e aceita-os cognitivamente, mas tem uma aversão doentia às disciplinas espirituais interiores: oração, jejum e leitura devocional. Solitude tornou-se uma retórica exaustivamente ensinada, escrita e pregada, contudo poucos são os que estão a vivenciar cotidianamente.

No chamado mundo pós-moderno, de ativismo exagerado, agendas sem espaço para reflexão, orar tornou-se uma atividade “preguiçosa”, para quem não está fazendo nada: os desocupados. O mundo industrial, tecnológico, científico e pragmático define o ser na perspectiva da realização, portanto, imagens de gente pensando e meditando, são uma aberração e um anacronismo medieval.

Ora, com isto não estou dizendo que os aspectos práticos e produtivos não têm importância, tem e muita, esta revista não existiria se não houvesse pessoas nos bastidores trabalhando ativamente: jornalistas, redatores, vendedores, marketing etc. Contudo, atividades como um fim em si mesma produzem vazio, perda de significado e sentido da própria vida.

É possível que tenhamos o mundo evangélico em crescimento e dinâmico, mas estas ações precisam refletir uma atitude interior transformada, pacificada e santificada, caso contrário, tornamo-nos pessoas exigentes, impacientes e legalistas, voltados à uma “excelência empresarial” sem a candura e a paz de Cristo que tranquiliza o coração.

Como comunidade cristã somos chamados, não apenas ao serviço, mas sobretudo a adoração, isso implica em uma agenda diária em que haja espaço de desenvolvimento intímo com Aquele que estabeleceu um padrão de interioridade centrado na sua relação com o Pai.

A cristandande proporcionou-nos modelos de homens e mulheres que, apesar de uma vida cotidiana atarefada e profundamente ativa, reservava tempo a fim de estar na presença Daquele que é a única essência de vida e de significado. Lutero dizia: “eu tenho uma vida tão atarefada que não posso passar duas horas diárias sem oração”, Calvino, quando estava sendo investigado pelo clero romano, foi encontrado em seu pequeno quarto orando e meditando. Os pais da igreja como Agostinho, Atanásio, Gregório de Nazianzo, Basílio entre outros, apesar de serem homens ativos nas suas paróquias e cidades viviam a santidade da “adoração, estudo, meditação e oração”.

Jesus, tinha uma vida assoberbada de trabalho na sua comunidade que incluía: ensino, pregação, libertação de enfermos e possessos (Mt. 4:23-24), além de uma vida dedicada ao seus discípulos (Mt. 10:1-23). Era um homem perseguido pelas multidões que viviam sob a égide da opressão espiritual (Mt: 4:25), entretanto ele encontrava tempo a fim de estar na presença do Pai (Mt:14.23). Seu momento a sós não era uma ausência do não ter o que fazer, como se a oração fosse legitimadora da ociosidade, antes era uma decisão consciente de estar em comunhão com o Aba.

Crentes vazios, estressados, raivosos, ranzinzas, ciumentos, invejosos, competitivos e exigentes principalmente com os outros, refletem uma profunda ausência de um relacionamento com a Santíssima Trindade. Ele transforma as mágoas, os desgostos da vida, as decepções, as ambiguidades, as fraquezas emocionais e os pecados intímos, em alegria, compreensão, carinho, ternura, aceitação e perdão.

Troque o divã secular pelo “colo” Daquele que cura corações enfraquecidos. Redescubra a oração como um lugar de aconchego e não apenas de lutas entre “deuses” espirituais. Oração é conversa de amor entre seres que se amam, em que Ele é o maior prazer de busca e sentido. Faça isso hoje e não amanhã quando achar que vai ter tempo. É possível que você volte a ficar apaixonado pelo primeiro e único amor de sua vida: Jesus Cristo.(Ap. 2:4).

Josenaldo Silva
Lisboa, Portugal

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